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quinta-feira, 12 de outubro de 2017

A matemática nos tribunais: uso e abuso dos números em julgamentos

Créditos: Site da editora Zahar

As autoras, mãe e filha, trazem uma lista de 10 casos que envolvem o (mau) uso da matemática em tribunais, especificamente quando depoentes em juízo fizeram cálculos errados e apresentaram tais cálculos como provas que foram usadas para condenar ou absolver réus. O livro serve como um grande alerta para que pessoas que não tenham conhecimento suficiente em matemática não se aventurem a emitir análises levianas.

Os dois casos mais famosos analisados são da acusação de assassinato de Meredith Kercher por Amanda Knox e Raffaele Sollecito no começo do século XXI e da acusação de traição de Alfred Dreyfus pelo exército francês no final do século XIX.

Já o caso Charles Ponzi é uma ótima explicação sobre o funcionamento das pirâmides financeiras, que continuam atraindo investidores desavisados com promessas de ganhos fáceis. O caso, de crime financeiro, me leva a lembrar do interessante filme "A Grande Aposta" de 2015, do diretor Adam McKay, sobre a crise financeira de 2008, disponível no Netflix. Segue abaixo o final do capítulo sobre o caso Ponzi:

"COMO REVELOU O CASO recente de Bernie Madoff, os esquemas de Ponzi ainda têm o poder de seduzir investidores ingênuos – mas gananciosos. E não só um, mas milhares e milhares de pessoas. De outro modo, o plano jamais decolaria. Mas como é possível que as pessoas não tenham aprendido a lição a partir do colapso do lendário esquema de Ponzi? Há duas respostas para a pergunta, e uma delas vem direto de J.P. Morgan: confiança.

O problema é que, para gente como Charles Ponzi – ou o píton Kaa, em O livro da selva: as histórias de Mogli –, o carisma pode produzir confiança lá onde ela não deveria vicejar. O próprio Madoff, durante a investigação de seu caso, notou com perplexidade que os reguladores que investigavam sua corretora de ações nunca chegaram a pedir para ver os registros de ações. Deve-se acrescentar que Madoff mantinha estreitas e afetuosas amizades com a maioria das pessoas que ocupavam cargos importantes na Securities and Exchange Commission (SEC) dos Estados Unidos, responsável por tais investigações. Entre 1992 e 2008, quando Madoff foi preso, a SEC foi responsável por seis investigações diferentes sobre ele, nenhuma das quais notou coisa alguma de anormal. Contudo, ninguém acusou a SEC de encobrir nada. Aceita-se que o carisma de Madoff era tão avassalador que os investigadores não podiam deixar de ter confiança nele, exatamente o mesmo que os clientes faziam ao pôr dinheiro em suas mãos. E os investigadores continuaram assim durante anos, apesar dos estridentes gritos de alguns - sempre há alguém que simplesmente não é hipnotizado –, como o analista financeiro Harry Markopolos, que afirmava repetidamente à SEC que os retornos de Madoff eram matematicamente impossíveis.

E isso nos leva diretamente à segunda resposta à nossa pergunta. Os esquemas tipo Ponzi ainda existem – e funcionam – porque não há gente com consciência matemática suficiente para fazer a dedução que Harry Markopolos fez. Como relata em seu empolgante livro No One Would Listen, Markopolos tentou alertar a indústria, o governo e a imprensa para o problema durante um período de mais de dez anos. O título do seu livro expressa sucintamente as reações que obteve.

Madoff não foi preso até o dia em que seu esquema desabou, como era matematicamente certo de esperar, e ele não pôde honrar os pagamentos que havia prometido aos clientes. Nesse dia, ele confessou a verdade a seus filhos. Chocados, eles o denunciaram à polícia. Madoff foi imediatamente preso, julgado e condenado a 150 anos de prisão. Agora ele compartilha a intimidade de famosos como o espião israelo-americano Jonathan Pollard e o chefão do crime Carmine Persico. Um total estimado de US$ 18 bilhões foi definitivamente perdido por seus investidores, entre os quais se acha um grande número de instituições de caridade dedicadas a apoiar a educação, grupos de jovens e hospitais. O público falhou em aprender a lição do esquema criado por Ponzi. Quem sabe a experiência com Bernie Madoff possa ao menos ter uma consequência positiva: a compreensão pública da impossibilidade matemática desse tipo de proposta.

Cuidado com os investimentos com crescimento exponencial – eles não podem dar certo!" (SCHNEPS; COLMEZ, 2014, p. 197-198).

Referência
SCHNEPS, Leila; COLMEZ, Colarie. A matemática nos tribunais: uso e abuso dos números em julgamentos. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.

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